segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Tim tim


Fitou-me por algum tempo em silêncio, antes que voltasse a falar. Derrepente, por mais absurdo que me parecesse, começou a gargalhar. Ria alto chamando a atenção de todos ao nosso redor. Eu por minha vez não resisti e esbocei um leve sorriso, com os olhos ávidos cravados nele conjeturava a possibilidade de uma simples faquinha em minha bolsa. Seria o suficiente para arrancar as risadas encarnadas na língua, picotar e destrubir esse ranço alegre. Ah, como eu destesto esses rompantes endemoniados do Assis. Se pelo menos dançasse bem um tango, mas não, so me fitava com aqueles olhos semicerrados de quem ja tomou meio litro de Jack Daniels, pensando bem, se eu tivesse a coragem. Iria assassina-lo.
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Bom, pelo menos me satisfaria. Porque o motivo do riso estava lá, no fundo do salão, exibindo um belo sorriso na face de boneca.
Sinuosa a boca que esboçava o sorriso, sinuosa a sombra projetada não somente nas paredes, mas nas minhas mãos que lhe empurrava as ancas aveludadas. Tinha ímpetos de cometer um desatino, tanto whiskey, tantas facas imaginadas correndo diante dos meus olhos. Desejo e morte. Morte e desejo.
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Não, não foi suficiente apenas olhar, devorar com palavras seus atos escusos. Nem imaginar um espancamento de pobres como imaginou Baudelaire.
Endemoniada seria nossa vida, nossa dança repleta de risos escorregadios pelo salão envernizado onde escorria o verniz dos nossos rostos.
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Pensei que tudo isso fosse o bastante. Mas ainda assim, não foi o suficiente porque havia em mim uma ânsia em compreender a verdade, aquela que meu avô falava ser verdadeiramente o que é; um copo como um copo; uma mesa como uma mesa. Essa me escapou como escapou sua gargalhada, seu desejo, seu olhar. Restava essa garrafa vazia sobre a mesa. Imensa embriaguez.
Discreta, abri a bolsa, peguei cuidadosamente a pequena faca e aliviada lancei-a longe. Um leve sorriso surgiu e aos poucos comecei a gargalhar também.
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A graça agora estava em mim, tola, preenchendo minha mente de idiotices sem fim, perdendo meu tão valioso tempo. Estava em um jantar maravilhoso, acompanhada do homem que tanto amava. Sem mais pensar me aproximei de Assis e fiz menção de beijá-lo. Mas deveria ter pensando um bocadinho mais. Ele percebendo minha tática, delicadamente afastou seu rosto da possibilidade desse encontro. E com seu sorriso singular me disse:


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- Não estava pensando em me matar estava?

- Claro que não, menti. Curiosa, ainda pensei, este homem lê pensamentos. Não era de se esperar que ele achasse que eu queria matá-lo, ainda mais depois do que ele me fez. Uma traição imperdoável. Traiu a mim, meus sentimentos mais profundos. Eu o amava e a dor foi muita. Vim a este bar determinada a dizer as últimas verdades. Em mim havia um desejo de fim, um desejo tão triste e angustiado. Mas aquele sorriso me encantou novamente, e ainda que me sentisse traída, caia nos braços de meu homem. Ah o amor, que coisa terrível. Peguei o copo de Jack Daniels e disse a mim mesma. De hoje em diante, não viverei uma existência social, mais serei uma meretriz desalmada.


Sueli Aduan, Anonimo, Sergio Cajado, Katia Mota, Alisson da Hora, Tina e Léo Metallica
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sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Seria o suficiente...



Fitou-me por algum tempo em silêncio, antes que voltasse a falar. Derrepente, por mais absurdo que me parecesse, começou a gargalhar. Ria e ria alto chamando a atenção de todos ao nosso redor. Eu por minha vez não resisti e esbocei um leve sorriso, com os olhos ávidos cravados nele conjeturava a possibilidade de uma simples faquinha em minha bolsa.
Seria o suficiente...

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Um homem de fé


A fé pode mover montanhas mas não
abre tuneis pra encurtar o caminho. N.M.

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Meu nome é Neurolho de Matos. Porque minha mãe fez esta maldade comigo so meu pai sabe. Vivo em pleno século dezoito ou seja, nada mais ha para ser inventado portanto hoje resolvi por fogo no meu laboratório ja que não descobri a pedra filosofal não transformei chumbo em ouro nem inventei o moto continuo.

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Hoje ao acordar e ao ver tudo em cinzas não pude deixar de exclamar, macacos me mordam e foi literalmente o que aconteceu. Um tipo de mico muito cabeludo entrou pela janela e me deu uma dentada no polegar direito, precisamente, indicador e polegar. Ainda perplexo com o inusitado da situação e mesmo sofrendo terríveis dores não pude deixar de pensar no poder que talvez exista nas palavras lançadas ao vento e de soslaio percebei que o fogo não tinha destruído totalmente aquele manuscrito.

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Foi o suficiente para despertar em mim uma sede de expressão. Peguei o que sobrou do texto e guardei-o no bolso de minha casaca. Não poderia escrever naquele momento com o dedo doendo como estava.
O mico saiu guinchando por onde entrou derrubando o pouco que havia sobrado do laboratorio. Raios gritei e foi neste instante que um raio arrancou o telhado que desmoronou sobre minha cabeça. Meio tonto levantei não ousando proferir uma so mais palavra. Algo muito insensato estava acontecendo, não parecia ser real, belisquei-me para ter certeza que estava acordado o que fez meu dedo doer mais ainda.
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- Com mil diabos exclamei! A porta se abriu e pra minha surpresa vi a minha frente:
Ele. O próprio em pessoa. Apenas com o levantar de um dedo e todos os outros se foram. Que legião, quanta obediência.Sorriu-me ao ler meu pensamento de inveja e me ofereceu cuidados especiais para com meu dedo.Trêmulo recusei. Persuasivo ele acabou me convencendo. Uma aliança nascia tirei do bolso o manuscrito onde guardada minhas ideias mais secretas. Mas para ele não eram assim tão secretas.
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Me disse que era o realizador de sonhos. Disse que seu nome não era satã, diabo ou coisa parecida. Lucifer era seu nome, do latim faça-se a luz. Contou como a igreja o tinha transformado no inimigo publico numero um só pra destruir sua popularidade. Contou que era o protetor das crianças e que não distinguia entre bem e mal, so realizava desejos. Lembrei ter lido um manuscrito de um tal de Goethe onde o personagem principal tinha que pagar seus desejos com a alma. Ele me esclareceu que não queria a alma de ninguem e que isso tambem fazia parte da estrategia da igreja.
Sentamos.
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Ele me contou a historia dos papas e sua arrogancia em dizer-se mensageiros exclusivos do Pai. Disse que era muito amigo de Deus pois fora uma de suas primeiras criações e como por todo o universo ajudara a criar seres sencientes. Então me disse:

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- Senhor Matos, eu lhe digo que não ha diferença entre o profano e o sagrado. Sois todos crianças a brincar nos jardins de meu Pai. Fiquei estupefato. Ainda trêmulo diante de tal criatura esqueci-me de tantos pensamentos materializados. Tentei demonstrar minhas certezas, mas minha voz me traiu. Arrogante perguntei:
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- Quem és tu? Quem és tu que atemoriza que desune que é caluniador que confunde e distorce os fatos? Ele desviando o olhar com um sorriso quase angelical respondeu-me:

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- Sou parte de uma parte que foi todo, uma parte das trevas, que geraram a altiva luz. Mas também sou o que fizeram de mim. Uma representação do mal. Muitos são os injustiçados mas o verdadeiro Pai a tudo vê e tudo compreende. Derrepente como se estivesse no alto de uma torre muito distante disse ainda:

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- E vc é o medo de tudo viver de tudo amar, mas ainda assim há de perecer diante de sua ignonímia.
Ainda mais estupefato pela loucura que estava vivenciando, perguntei:
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- De onde vens? Porque começas a desvanecer?

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- Pois assim é e deves acreditar. Desvanesço pois não sou aqui necessário. Falo agora de dentro de tua cabeça minha criança, enquanto divagas sobre existências divina, esquece-te de tua própria pessoa e estás enlouquecendo devido a teus fracassos em nome da ciência hermética.
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Neste momento pus minha cabeça em prostação certo agora de ter um propósito pela frente. Peguei minha pena, herança de meu pai, olhei-a contra a luz e algo em meu cérebro se acendeu e escreví como nunca havia escrito. Tal insanidade aplicada aos escritos foi tão extraordinária que não me dei conta de que agora estava livre dos demonios que outrora habitavam meus desejos.

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Sueli Aduan, Sergio Cajado, Youkai e Léo Metallica
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quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Um homem de fé


A fé pode mover montanhas mas não

abre tuneis pra encurtar o caminho. N.M.

Meu nome é Neurolho de Matos. Porque minha mãe fez esta maldade comigo so meu pai sabe. Vivo em pleno século dezoito ou seja, nada mais ha para ser inventado portanto hoje resolvi por fogo no meu laboratório ja que não descobri a pedra filosofal não transformei chumbo em ouro nem inventei o moto continuo.

Hoje ao acordar e ao ver tudo em cinzas não pude deixar de exclamar, macacos me mordam e foi literalmente o que aconteceu. Um tipo de mico muito cabeludo entrou pela janela e me deu uma dentada no

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Às voltas com o tempo




Panta rei, diz Heráclito, se é que disse. Tudo corre, tudo passa, tudo flui. Não posso entrar no mesmo rio duas vezes, porque não será mais o mesmo rio. Muda o rio, mudo eu? Mas, então, a minha nuca que recebeu hoje um beijo e sentiu hoje um arrepio, amanhã -tomara os receba e sinta- não será mais a mesma nuca? Ou não serão os mesmos pêlos a se eriçarem? Ou não a beijará a mesma boca, ainda que seja a mesma? E o caminho que percorro todos os dias até o trabalho, como posso sentir por isso tamanho tédio, se tudo já mudou? Cada árvore, cada passeio e passeante, cada carro e cada nuvem, cada som e cada cheiro e cada cor, cada eu que já passou. Se já não sou a mesma de ontem e não serei eu-hoje amanhã, então, quem sou?

Sim, quem sou? Ontem passei em frente à mesma farmácia na qual um cara fantasiado de pacote de fraldas descartáveis ganhava o seu trocado. Vá lá, honestamente, que era um papel ridículo, era. Mas amanhã ele deixará de ser essa coisa imposta pela necessidade. Eu não, serei eu mesma. Ou não. Talvez cada hora que eu olhe, por cima do parapeito da ponte, o rio que corta minha cidade - rio que já mudou de curso, teve o seu leito assoreado, já inundou a ilha sobre qual se funda nossas vidas- seja uma hora ridiculamente igual. Diferente só meu modo de olhar, minha invenção de viver assim, só olhando, pensando, deixando as coisas acontecerem e eu não mudar. Não mudar? Tudo muda! Eu, me olhando no espelho, meus resquícios de mesmice.

Penso que talvez eu não seja a sombra do tempo consumida pelas cinzas e tons que se desintegram. Nada mais é, o que nem sequer já foi, nem eu. Nas águas, ou em qualquer outro elemento, as marcas que não possuem significado algum determinam as eras, datam a insignificância e a beleza do estado do devir permanente, incluindo eu. Digo então: a compreensão tem de ser conquistada. Digo então: a arrogância tem de ser conquistada. Mas nada nem ninguém conquistará o incontestável estado de movimento indiferente da energia que repousa em todas as coisas. Panta Rei, pensou Heráclito, os olho fitos num rio em que não me banharei. Talvez por força do hábito. Eu periclito, mas rio do mar que outrora pensei.

Heráclito e seu rio. Eu, eu sou mar, eu sou maré. Sou ressaca lambendo as pedras na praia. Sou a chama de uma vela que queima sem cessar, transformando a cera em fogo, o fogo em fumaça e a fumaça em ar. E o dia se torna noite, o verão se torna outono, o novo fica velho. O quente esfria, o úmido seca.

E tudo nos oferece ofertas ocas na vida. Sou todo o nada nadando no vazio no cio do absoluto, perdendo-me no infinito do eco de minhas incertezas azedas. Idas, indas e vindas de uma lima que rola roliça em terreno plano quadrado torto inclinado sem certas ofertas. Sobe, e o que trouxe? Desce o trago da vida que suga convoca convida expira e inspira a (s)er, mais que nada, sendo. O tudo, os vazios dispersos sob os olhos dos cegos. Pulo dos que nada inspiram, desvio dos que nada ofegam, derrapo dos que vegetam, driblo os que esqueceram de morrer. Prossigo doando sobras de espaços vazios a serem preenchidos com palavras lineares desconexas convergentes complexas congruentes óbvias sóbrias. Começo-meio-fim, paro. A palavra sou eu.


A infinitude do passar, passar, passar, e vir a ser um raspão veloz, atordoada de vida, era de muitas eras. Eu era... finita e eterna. Como posso dizer como se fosse lógico este incompreensível fato finito sem fim. A cabeça não alcança a veloz idade do tempo e se desmancha daí, sem ser acaba sendo. A mancha do que passou e não há mais sem deixar de ser. O beijo impresso pela boca que não é, na nuca que jamais será. Eu fragmento me pondo inteira na ficção dos pedaços da vida. O tempo me expandiu em muito mais de muitas vidas. Tornei-me plural de mim tão singular.

E o tempo nos oferece a oportunidade de ser-de-novo, ser-continuamente; o medo de ser-em-partes, ser-fragmentado; a esperança de ser-pela-primeira vez, ser neo-nato. Pérpetuo primeiro de janeiro, ser novo ano a cada momento. Mas o que eu faço com isso que o tempo me faz?


Nada. Porque ele é o Deus/Tempo senhor absoluto. Aceito-o docemente, ouço sua voz sussurrando em meus ouvidos: _Memória e futuro juntos, talvez! Vivo, convivo na alegria de cada instante, na beleza de cada encontro em que me reecontro. Um eu feito de muitos outros e outros e tantos outros. Sou eu às voltas com o tempo.


Estiveram às voltas com o tempo: dana paulinelli, alisson da hora, youkai, christiana, sueli aduan, nanda lym e cristina siqueira.


segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Panta rei



Panta rei, diz Heráclito, se é que disse. Tudo corre, tudo passa, tudo flui. Não posso entrar no mesmo rio duas vezes, porque não será mais o mesmo rio. Muda o rio, mudo eu? Mas, então, os dentes que eu escovarei amanhã - se é que os escovarei- não serão os dentes que escovei hoje? E a minha nuca que recebeu hoje um beijo e sentiu hoje um arrepio, amanhã -tomara os receba e sinta- não será mais a mesma nuca? Ou não serão os mesmos pêlos a se eriçarem? Ou não a beijará a mesma boca, ainda que seja a mesma? E o caminho que percorro todos os dias até o trabalho, como posso sentir por isso tamanho tédio, se tudo já mudou? Cada árvore, cada passeio e passeante, cada carro e cada nuvem, cada som e cada cheiro e cada cor, cada eu que já passou. Se já não sou a mesma de ontem e não serei eu-hoje amanhã, então, quem sou?

domingo, 15 de novembro de 2009

Meu passado, meu futuro.


Tem alguém lá fora, eu sei. Sempre tem, está à espreita, me esperando sair... Ele me quer e eu também o quero, mas e essa dúvida que não me abandona nunca, esse impasse sem fim entre o sonho e a realidade.
Por uns instantes meus pés vacilam, dou um passo a frente, sigo,toco a maçaneta. E num piscar de olhos vejo que todo desejo vem numa explosão lancinante. Tudo é presumido. Olhares e lembranças povoam o vagar lento de minhas ideias. Não não é o desejo que me atordoa, é a dúvida.

Tem alguém em algum lugar que não está a espreita mas tem o mesmo desejo, a mesma duvida mas seus olhos não me vêem, apenas sabem que me tem, de certa forma.
Talvez eu não saiba que ele está lá, só desejo tão fortemente que esteja que chego a acreditar nisso!
Passo a acreditar nele, passo a duvidar de mim. Para preservar minha sanidade busco rastros de realidade. Encontro. Foi real. Vestígios de uma história, cartas amareladas. Mas não quero viver de passado. Já nem quero ser sã. Quero simplesmente tornar tudo isso um presente, dar continuidade.. Fazer com que se transforme em uma vida inteira!
E há uma força, uma intromissão que quer roubar de mim o que construí. Qual o problema que o passado tome para si todo o presente?
É meu! Tanto quanto os sonhos, os desejos, os olhos à espreita, os que não espreitam, mas lá estão.
Sonho ou realidade por uns instantes ou pra vida toda. Não importa, ainda assim, são meus e tão somente.

O outro lado da porta me espera.

Mas para atravessá-la preciso primeiro transpor os umbrais da dúvida e do medo. Entrar nos vãos do desejo. Pular da sacada em um gesto alucinado de entrega.

Quando estar meu próprio olhar no espelho, teus olhos a me seguirem só me darão prazer. Então, só então, te atravessarei.

Talvez não esteja pronta para viver.


Tina, sueli aduan, CajadOmatic, dana paulinelli e Katia Mota.

sábado, 14 de novembro de 2009

Lá fora...

Tem alguém lá fora, eu sei. Sempre tem, está à espreita, me esperando sair... Ele me quer.
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sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Segredo sob neve



“Perdera a conta de quantas voltas dera em torno do quarteirão. Em cada uma delas os olhos se dirigiam para a janela do terceiro andar na esperança de que as luzes se apagassem. Ansiava por um sinal de assentimento à sua fuga, de conivência com sua covardia. Mas aquele abajur opalinado que tantas vezes acendera, tateando no escuro, insistia em se manter aceso. O sinal era opaco, mas incontestável: a verdade precisava vir à luz.


Determinado,  parou o carro em frente à entrada do pequeno hotel de apartamentos e depressa se pôs a subir as escadas. Sentia-se cansado. Ofegava. Já não era aquele adolescente atlético e simpático que atraía a atenção das garotas. No segundo andar se deu conta de que apenas o cansaço não era causa suficiente para a taquicardia. Parou para descansar um pouco. As lâmpadas das escadas estavam apagadas e através da penumbra percebeu um corpo caído e que os seus sapatos estavam em uma poça de sangue. Com a visão de um possível cadáver, seus músculos aquecidos se contraíram repentinamente e junto com o susto veio a perda do equilíbrio, os braços dançaram no ar em busca de apoio, mas sua sorte já havia sido lançada. Tombou de costas contra um lance de degraus sólidos e sentiu uma dor aguda e excruciante nas costelas que se partiam com o choque. Mas o pior ainda não passara, com a inércia e a gravidade a seu favor, em sentido sarcástico, rolou escada abaixo em rotação desengonçada, partindo seus ossos do braço esquerdo, seu nariz, seu maxilar, abrindo o supercílio e, por fim, estirando-se de costas contra uma parede de canto qualquer, inconsciente pelas sucessivas pancadas na cabeça.


O barulho estrondoso da queda despertou os vizinhos. Portas se entreabiram. Pessoas assustadas olhavam pelas frestas. Aos poucos deixaram seus apartamentos, vinham de todos os andares e se amontoavam em volta do corpo caído na escada. Estavam prestes a socorrê-lo quando ouviram um grito de pavor ecoando do terceiro andar. Era mais uma vítima, não fora a primeira, nem seria a última daquela noite no Hotel Darbus. Um dos moradores resolveu descer e pedir ajuda na rua quando percebeu que todas as portas estavam trancadas. De repente todas as luzes se apagaram. Apenas a luz do terceiro andar continuava acesa, como um dedo em riste aponta um criminoso.”


Ele, misteriosamente, clareava aquele pequeno espaço na tentativa de que o segredo viesse à tona.  Parou de escrever e releu o texto. Havia escrito muitos romances policiais em sua vida mas deste dependia sua aceitação nesta editora.


Acendeu um cigarro e foi até a janela. Precisava dar continuidade, manter o suspense, despertar o interesse, ser inovador. Jogou-se na poltrona da sala olhando para o teto. Nada mais vinha à sua cabeça. Lembrou-se de antigos filmes com o Humphrey Bogart. Detestava Casablanca. Gostava de A rainha da África.


Resolveu voltar para o hotel. Sentia-se tão quebrado como seu personagem. Olhou o teclado com letrinhas sorridentes e apertou retorno. Nova linha, agora em branco. A luz do terceiro andar se apagara de repente.


Deitado, observando a neve cair por trás da janela, refletia sobre o título do romance abortado. Sobrou neve e faltou segredo. Restava-lhe apenas sono sob neve. Antes dormisse ele que seus leitores.


Tina, Fred Matos, Youkai, Sueli Aduan, Cajadomatic, Dana Paulinelli

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Segredo sob neve

Perdera a conta de quantas voltas dera em torno do quarteirão. Em cada uma delas seus olhos se dirigiam para a janela do terceiro andar na esperança de que as luzes se apagassem. Ansiava por um sinal de assentimento à sua fuga, de conivência com sua covardia. Mas aquele abajur opalinado que tantas vezes acendera, tateando no escuro, insistia em se manter aceso. O sinal era opaco, mas incontestável: a verdade precisava vir à luz.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

CONTA A LENDA...


Conta a lenda que dormia. Uma Princesa encantada A quem só despertariaUm Infante, que viria. De além do muro da estrada. Ele tinha que, tentado, Vencer o mal e o bem... ....Ele dela é ignorado, Ela para ele é ninguém....
...E, se bem que seja obscuro. Tudo pela estrada fora, E falso, ele vem seguro.E vencendo estrada e muro,Chega onde em sono ela mora, E, inda tonto do que houvera, À cabeça, em maresia, Ergue a mão, e encontra hera, E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
Fernando Pessoa

Conta a lenda...

Que do colo branco e nu de Teresa nasciam flores multicoloridas. Alguns se perguntavam se seria magia, outro se seria reação espontânea de uma paixão escondida. A despeito da curiosidade, crescia o mistério. Inútil negar, ainda que de olhos bem fechados o aroma das flores. Dessa lenda, alguns se perguntavam também se isso não poderia ser uma espécie de maldição velada. Porque, por mais que seja inegável o perfume das flores, nada se compara ao colo nu de uma mulher.

Reza também a lenda que Tereza seria a própria flor, que o perfume exalava era dela. De olhos bem fechados escondia de si própria à paixão que dela fazia brotar as flores.

Deixou as flores na mesa. Onde estaria aquele vaso? Vasculhou portas, gavetas e armários como alguém que busca o mapa de secreto de um tesouro perdido, mas decididamente não haveria vasos para tantas flores. Não haveria colo para tantas flores. Não haveria Tereza para tantos amores.

E, de olhos bem fechados, com um quase sorriso, Tereza sonhava,com o dia em que o dono e merecedor de tantas flores chegasse.Ela não era a Teresa de tantos amores, era a Teresa do maior e mais belo amor!

Disparate, conclui apertando o caule do vegetal com tanta força, que estranha a si mesma. Era uma lágrima aquilo que descia na maçã do rosto? Riu. Desdenhou o barulho do grupo de crianças que corria com mochilas nas costa do lado de fora. Não, ela nunca foi uma criança, essas lembranças são tão distantes que parecem uma mentira rara. Mentira confortável como aquelas que inventava a noite, antes de dormir. As viagens que nunca fez e namoros acalorados que nunca teve. É hora de ir, ela sabe: mesmo que a vontade fosse evitar todas aquelas conveniências automáticas que dia lhe guardava a como um plano cartesiano.

Era hora de ser o que sempre foi sonho e pensamento, no entanto, em sua alma o ponto localizado, o chamamento da natureza impondo-lhe sua força, que sentida em todos os poros de seu corpo levava-a, mesmo com um leve sorrir, derramar uma lágrima.
Era preciso romper seus limites. De olhos bem fechados, exalando todo o perfume que lhe pertencia era inevitável viver seu maior desejo. O de ser flor.

Desejo que se apoderou de Teresa e tomou-lhe as pernas e fez delas raízes, e tomou-lhe os braços que se enrijeceram e se tornaram galhos. E de cada pêlo do corpo, uma folha nascia. E de cada saudade vivida, do colo branco e nu, uma flor destinada a murchar. E de cada ponto de seu corpo que já recebera um toque de amor, a pele se multiplicava e cobria um fruto. E seus cabelos se transformaram em ninhos de pássaros. Mas a face de Teresa não se transformara.

Desde então, Teresa é corpo de árvore e face de mulher. Para todo o sempre.

Fim!

Daniela Paulinelli, Leonardo Delarete Pimenta, Katia Mota, Anônimo, Tina, Sueli Aduan.


segunda-feira, 2 de novembro de 2009

A grande solidão


Em momentos como este, retiro meus pensamentos e deixo o mundo divagar sobre o destino. Que se pode fazer? Quando olho, percebo. Percebo e concluo. Concluo e me calo. Ha de haver em algum angulo uma visão não percebida, da ótica a ação basta um momento para criar a solução, mas não me alento e caio no chão sem esperança de encontrar uma saída. A saída é vastidão. Mirar ao longe e só o horizonte. E cada homem é uma ilha.

La neste infinito talvez aconteçam os sonhos mas entregar-se aos sonhos seria egoismo. Proponho um arquipelago de sonhos conjuntos. Embora saiba que minha insignificancia é equivalente ao quanto a nego! Vou iludir-me com esperanças que cabem no vazio da materia, do atomo, no vazio de meu estomago e amago. Neste vazio imenso do mundo. Um mundo superlotado de corações de gelo.. Talvez eu seja um deles!

Mas também sou a percepção sensorial das coisas, sendo elas, as coisas como as percebemos a própria realidade, ainda que instável e caótica, sem nenhuma outra dimensão subjacente ou transcendente, por isso mesmo sigo, me debato, me reviro, me agito, mas talvez nossa labuta seja exatamente esta, permitir que as borbulhas se tornem espuma do mar.Esta vastidão onde me perco, não sei se sou este além do horizonte onde mergulho o olhar buscando vestígios da lua de ontem a noite que escorregou da luz solar. Com a sucessão dos dias enlouqueço do mal da espera...Contei muitas luas e êle não volta.Penso que vou me dissolver, sal em espuma...nevoeiro,bruma.

Então peço perdão por ter ousado imaginar as espumas flutuantes de castro alves, o avesso infinito de meu peso, do que me ata ao chão e me faz olhar para o céu. Alçar vôo, desprender-me da mãe terra que me sustenta com seu ar etéreo, sua agua diáfana que completa os vazios entre minhas moleculas de carbono.

Tenho aqui em meu estomago um nó que não se desfaz, que me lembra que a todo dia essa imensidão do vazio ajuda à reflexão e a encontrarmos a paz de espírito que a vida nos rouba a cada momnento. E como é necessário ter tanto tempo para nada fazer!

O centro escuro das sensações me imprimem ritmo, ilha em oceano de sentimentos. O que se destaca é a auto-piedade, a pena da dor que navega pela vastidao de meu eu.

O vazio me feriu e me aconchegou em seu peito de ebano. As lagrimas do desespero nao cessaram neste conflito, mais aqui terei todo tempo do mundo para me recompor, para achar o centro perdido de mim.

Sou em mim, a imagem do criador, alma imortal, espirito perene em evolução. Neste instante de vida, me pergunto... se vale a pena sentir.

By: Katia Mota, Sergio Cajado, Youkai, Tina, Sueli Aduan Cristina Siqueira, Manuel Afonso
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