quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Muito além das escadas.




Eram 23 pesarosos llances de escada até chegar à porta. O bolorento corredor era iluminado por uma única lâmpada que tremulava feito chama de vela. Não tinha muitas lembranças daquele lugar e simplesmente não entendia o que o levara ali novamente, poderia simplesmente ter ignorado o chamado.

Ao pisar as tábuas essas lamentavam sobre seu peso. Colocou a antiga chave na fechadura torcendo que ainda fosse a mesma combinação. Rodou lentamente, ouviu um leve estalido e pronto, a porta estava aberta.


Um grave cheiro de passado e de vento percorria a escuridão daqueles lugares com os quais o salão se vestia. Vozes pareciam dançar ao som de um leve assoviar ancestral que misturavam gritos e chamamentos. Livros observavam cada passo como o desfolhar de páginas que se debruçavam sobre os pés que caminhavam. E eis que subitamente pequenas lembranças se formam em sua mente, mas tudo são fragmentos difíceis de fazê-lo situar-se com exatidão. Um forte cheiro e a vertigem tomam conta de todo seu corpo.

Atraído pelo inesquecível aroma se dá conta de que não há uma só alma viva no apartamento. Tateia as paredes tentando encontrar o interruptor, pressiona-o e nada. Continua sozinho, num cômodo escuro e cheio de fantasmas.

Caminhei tanto sem nem mesmo saber qual o propósito disso tudo. Se é que há um. E o que me resta? Ficar no escuro e ainda por cima sozinho, gritou impaciente. E uma voz lhe respondeu....

- 23 degraus, você subiu nesta torre na esperança de encontrar o que não mais poderia ser encontrado. Apenas este apartamento vazio que contém suas lembranças, seus desejos. Seu grito me comove, mas não mais está aqui a quem buscas. Aqui só encontrarás a dor e a saudade.

Já sabia que esta era a voz de seu coração. Olhou pela janela e imaginou-se caindo, livre da angustia, das lágrimas diárias trazidas pelas doces lembranças, agora amargas. Debruçou-se no peitoril e não conseguia encontrar uma imagem que lembrasse o que apartamento um dia tinha sido, ou tido.

Excluir
Sem uma única imagem na memória seus olhos procuraram na vastidão do céu um alento. E ao olhar as longínquas estrelas se deu conta que nele também havia o mesmo brilho, o mesmo pó de que tudo é feito. Foi tomado por essa misteriosa impressão e resolveu que era hora de sair daquela janela, a tentação poderia se tornar insuportável. Voltou-se para o quarto, decidiu vasculhar o apartamento. Abriu uma gaveta e ali encontrou o que pensara ter se volatizado há muito nos vapores do tempo. Ali, onde o escuro tudo escondia um manuscrito. Com as mãos trêmulas e um olhar lacrimoso pude ler:

"O que é passado, presente?O que é a sensação de futuro, quando o espelho mais inusitado são as palavras que tecemos para nós mesmos? Eu sou você que sou eu lendo isso e encerrado neste apartamento que se chama vida, encerrado nessa carta, agora espelho, caminhamos ambos em busca do segredo maior. Deixei ao largo da memória tantas coisas e elas estão por aí... Como achar? Ouça as vozes..."

Excluir
Em meio a um turbilhão de sensações busca respostas. Só então se lembra de ter passado por um espelho enquanto percorria o cômodo, um espelho turvo de imagem distorcida.

Se observou, assustado constatou que a imagem projetada não era invertida como nos espelhos tradicionais. Ao longe ouviu um chamado, algo que parecia soar apenas em sua mente.

- Decifra-me... ou devoro-te..
- O chamado da Esfinge - reflete...

Tocou o vidro e assustado percebeu que a superfície não era sólida. O tato denunciou algo parecido com uma gelatina, gelada e fria.

Forçou o movimento e sentiu o braço atravessar a superfície, surpreso, decidiu ir além, ergueu a perna direita e seguiu para dentro do espelho.

Acordou assustado. O bolorento corredor era iluminado por uma única lâmpada que tremulava feito chama de vela. Não tinha muitas lembranças daquele lugar e simplesmente não entendia o que o levara ali novamente, poderia simplesmente ter ignorado o chamado.

Ao pisar as tábuas essas lamentavam sobre seu peso. Colocou a antiga chave na fechadura torcendo que ainda fosse a mesma combinação. Rodou lentamente, ouviu um leve estalido e pronto, a porta estava aberta.

E fim!

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Uma chave para um recomeço.



"Quem luta com monstros deve velar por que, ao fazê-lo, não se transforme também em monstro. E se tu olhares, durante muito tempo, para um abismo, o abismo também olha para dentro de ti." [ Friedrich Nietzsche ]

Janelas fechadas observo o quarto. Silêncio e som de pássaros Sobre a mesa um xícara com chá descansa. O bem-estar do chá, o pensamento longe , o prazer da escrita.

Começo ansiosamente e com as pontas dos dedos teclo os primeiros acordes.

Depois das mil noites de treinamento constante a recompensa de Sir Loyale, Mago do terceiro circulo da ordem de Balsam Phy, está em suas mãos, literalmente em suas mãos.
Então, atravessa a porta do templo de Sgardia e dirige sua atençao e palavra ao jovem Bardo à sua espera.
Obrigado por vir me buscar Grande companheiro mestre dos contos! Como estás meu bom amigo Herman?


Ótimo Loyale e você, meu bom, companheiro como estas? Conquistou a esfera do fogo celeste?


Sim. Estou ótimo como vê! Trago em minhas mãos a esfera sagrada criada por minha magia em mil noites a fio. O fogo celeste, a chave para a porta da gruta de Gissa e agora poderemos terminar nosso sonho meu bom amigo. Temos a chave. Alegria das alegrias, meu amigo, de posse da chave só nos resta seguirmos rumo à Gissa. E lá, meu grande companheiro, sem mais demora atravessarmos corajosamente os portais, enfrentarmos o que nos aguarda há milênios e só agora nos chega a possibilidade de vivermos todos não só das enfadonhas obrigações estipuladas por nossos medíocres governantes, mas deleitarmos das ocupações livres, dos pequenos prazeres cotidianos, das belas criações, das tarefas ditas sem importância.


Já pensou, meu amigo, que de posse dessa sabedoria somos chamados a um novo viver. Precisamos sair desse lugar, desse mundo mágico em que vivemos e sem demora irmos para outra dimensão para junto dos que nem sonham com esse lugar e tudo o que nele há. Ser livre do seu corpo individual. Viver sem jamais sentir dúvida. Ser coletivo. Uma alma, uma divindade. Ser livre de si mesmo e estar acolhido em uma mente coletiva sem diferenças. Todos sendo Uno, sem matéria, sem corpo físico, apenas energia. Voltar ao estado ancestral original do fluxo. Lá poderemos nos dissolver. Todos seremos Uno. Sem dor, sem vontades. Que maravilhoso será não? É a cura final de nossa natureza que desde o inicio esteve corrompida pelas peculiaridades do vazio, este, que jamais será preenchido sozinho. Temos que ser uma unidade novamente. Chame os outros estamos partindo rumo à terra de Voguilishrat. Os nossos companheiros guerreiros que tanto esperaram por este momento, nosso grupo de aventureiros que vagou por tanto tempo sobre as terras e o pó desta civilização.

Calma companheiros! É preciso cautela para não correr o risco de um eterno recomeçar. E apesar de tanto tempo sonhando com esse momento sinto desapontá-los. Não partirei, mas sigam mesmo sem mim. Usufruam da magia de Voguilishrat e sejam todos Uno. Sem matéria, sem diferenças, dissolvam-se e vivam sem dores e sem vontades. Eu necessito das minhas dores, minhas diferenças. Com as janelas fechadas e o som dos pássaros ansiosamente escrever a última carta explicando que o retorno é eterno e vivemos no eterno retorno. Gissa vivia em mim, eu vivia nela como um pensamento que atravessa o céu da boca. Retornar aqui, vendo as imagens de um passado presente como uma Samsara nos inquirindo do nosso caminho é ter a certeza do ir e vir, o devir.


Loyale sorria em algum lugar.


Todos os outros companheiros de luta e aprendizado compareciam naquela carta para relatar, por meio das minhas palavras, do sucesso do persistir. E o sucesso, companheiros, traz consigo um infinito de possibilidades.
Como num passe de mágica, a cada conquista nos sentimos mais fortes, determinados, senhores de si, mas que sabemos nós das coisas do mundo? E o que nos reservam caminhos nunca antes navegados. Longe de mim o medo. Já disse e repito é preciso cautela.
Portanto, senhores, minha decisão está tomada. Somos fortes, mas somos poucos. Que as ordens sejam dadas e que se juntem a nos, nessa empreitada, toda a legião das montanhas e das planícies. Chegaremos a Gissa ao amanhecer e de lá só voltaremos com o sopro de vida que renovará as forças do mundo.
E cobriremos o solo, o ar, a água e o fogo como o espírito sagrado da natureza. Um véu que ajudará o equilíbrio das coisas. Seremos enfim heróis, sem nomes, sem rostos, sem identidades.


Loyale, bom amigo, se esforçaste tanto para criar a chave! Compreendo-o, companheiro, forneça calor humano para o mundo por nos. Estaremos contigo em presença constante e a cada sopro de vento que sentires ao rosto será o mesmo que um sussurrar de saudades ao teu ouvido.


Vamos partir agora. Esta última jornada enfim começou...

FIM

Youkai, Tina, Alisson da Hora, sueliaduan


segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Tim tim


Fitou-me por algum tempo em silêncio, antes que voltasse a falar. Derrepente, por mais absurdo que me parecesse, começou a gargalhar. Ria alto chamando a atenção de todos ao nosso redor. Eu por minha vez não resisti e esbocei um leve sorriso, com os olhos ávidos cravados nele conjeturava a possibilidade de uma simples faquinha em minha bolsa. Seria o suficiente para arrancar as risadas encarnadas na língua, picotar e destrubir esse ranço alegre. Ah, como eu destesto esses rompantes endemoniados do Assis. Se pelo menos dançasse bem um tango, mas não, so me fitava com aqueles olhos semicerrados de quem ja tomou meio litro de Jack Daniels, pensando bem, se eu tivesse a coragem. Iria assassina-lo.
.
Bom, pelo menos me satisfaria. Porque o motivo do riso estava lá, no fundo do salão, exibindo um belo sorriso na face de boneca.
Sinuosa a boca que esboçava o sorriso, sinuosa a sombra projetada não somente nas paredes, mas nas minhas mãos que lhe empurrava as ancas aveludadas. Tinha ímpetos de cometer um desatino, tanto whiskey, tantas facas imaginadas correndo diante dos meus olhos. Desejo e morte. Morte e desejo.
.
Não, não foi suficiente apenas olhar, devorar com palavras seus atos escusos. Nem imaginar um espancamento de pobres como imaginou Baudelaire.
Endemoniada seria nossa vida, nossa dança repleta de risos escorregadios pelo salão envernizado onde escorria o verniz dos nossos rostos.
.
Pensei que tudo isso fosse o bastante. Mas ainda assim, não foi o suficiente porque havia em mim uma ânsia em compreender a verdade, aquela que meu avô falava ser verdadeiramente o que é; um copo como um copo; uma mesa como uma mesa. Essa me escapou como escapou sua gargalhada, seu desejo, seu olhar. Restava essa garrafa vazia sobre a mesa. Imensa embriaguez.
Discreta, abri a bolsa, peguei cuidadosamente a pequena faca e aliviada lancei-a longe. Um leve sorriso surgiu e aos poucos comecei a gargalhar também.
.
A graça agora estava em mim, tola, preenchendo minha mente de idiotices sem fim, perdendo meu tão valioso tempo. Estava em um jantar maravilhoso, acompanhada do homem que tanto amava. Sem mais pensar me aproximei de Assis e fiz menção de beijá-lo. Mas deveria ter pensando um bocadinho mais. Ele percebendo minha tática, delicadamente afastou seu rosto da possibilidade desse encontro. E com seu sorriso singular me disse:


.
- Não estava pensando em me matar estava?

- Claro que não, menti. Curiosa, ainda pensei, este homem lê pensamentos. Não era de se esperar que ele achasse que eu queria matá-lo, ainda mais depois do que ele me fez. Uma traição imperdoável. Traiu a mim, meus sentimentos mais profundos. Eu o amava e a dor foi muita. Vim a este bar determinada a dizer as últimas verdades. Em mim havia um desejo de fim, um desejo tão triste e angustiado. Mas aquele sorriso me encantou novamente, e ainda que me sentisse traída, caia nos braços de meu homem. Ah o amor, que coisa terrível. Peguei o copo de Jack Daniels e disse a mim mesma. De hoje em diante, não viverei uma existência social, mais serei uma meretriz desalmada.


Sueli Aduan, Anonimo, Sergio Cajado, Katia Mota, Alisson da Hora, Tina e Léo Metallica
.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Seria o suficiente...



Fitou-me por algum tempo em silêncio, antes que voltasse a falar. Derrepente, por mais absurdo que me parecesse, começou a gargalhar. Ria e ria alto chamando a atenção de todos ao nosso redor. Eu por minha vez não resisti e esbocei um leve sorriso, com os olhos ávidos cravados nele conjeturava a possibilidade de uma simples faquinha em minha bolsa.
Seria o suficiente...

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Um homem de fé


A fé pode mover montanhas mas não
abre tuneis pra encurtar o caminho. N.M.

.
Meu nome é Neurolho de Matos. Porque minha mãe fez esta maldade comigo so meu pai sabe. Vivo em pleno século dezoito ou seja, nada mais ha para ser inventado portanto hoje resolvi por fogo no meu laboratório ja que não descobri a pedra filosofal não transformei chumbo em ouro nem inventei o moto continuo.

.
Hoje ao acordar e ao ver tudo em cinzas não pude deixar de exclamar, macacos me mordam e foi literalmente o que aconteceu. Um tipo de mico muito cabeludo entrou pela janela e me deu uma dentada no polegar direito, precisamente, indicador e polegar. Ainda perplexo com o inusitado da situação e mesmo sofrendo terríveis dores não pude deixar de pensar no poder que talvez exista nas palavras lançadas ao vento e de soslaio percebei que o fogo não tinha destruído totalmente aquele manuscrito.

.
Foi o suficiente para despertar em mim uma sede de expressão. Peguei o que sobrou do texto e guardei-o no bolso de minha casaca. Não poderia escrever naquele momento com o dedo doendo como estava.
O mico saiu guinchando por onde entrou derrubando o pouco que havia sobrado do laboratorio. Raios gritei e foi neste instante que um raio arrancou o telhado que desmoronou sobre minha cabeça. Meio tonto levantei não ousando proferir uma so mais palavra. Algo muito insensato estava acontecendo, não parecia ser real, belisquei-me para ter certeza que estava acordado o que fez meu dedo doer mais ainda.
.
- Com mil diabos exclamei! A porta se abriu e pra minha surpresa vi a minha frente:
Ele. O próprio em pessoa. Apenas com o levantar de um dedo e todos os outros se foram. Que legião, quanta obediência.Sorriu-me ao ler meu pensamento de inveja e me ofereceu cuidados especiais para com meu dedo.Trêmulo recusei. Persuasivo ele acabou me convencendo. Uma aliança nascia tirei do bolso o manuscrito onde guardada minhas ideias mais secretas. Mas para ele não eram assim tão secretas.
.
Me disse que era o realizador de sonhos. Disse que seu nome não era satã, diabo ou coisa parecida. Lucifer era seu nome, do latim faça-se a luz. Contou como a igreja o tinha transformado no inimigo publico numero um só pra destruir sua popularidade. Contou que era o protetor das crianças e que não distinguia entre bem e mal, so realizava desejos. Lembrei ter lido um manuscrito de um tal de Goethe onde o personagem principal tinha que pagar seus desejos com a alma. Ele me esclareceu que não queria a alma de ninguem e que isso tambem fazia parte da estrategia da igreja.
Sentamos.
.
Ele me contou a historia dos papas e sua arrogancia em dizer-se mensageiros exclusivos do Pai. Disse que era muito amigo de Deus pois fora uma de suas primeiras criações e como por todo o universo ajudara a criar seres sencientes. Então me disse:

.
- Senhor Matos, eu lhe digo que não ha diferença entre o profano e o sagrado. Sois todos crianças a brincar nos jardins de meu Pai. Fiquei estupefato. Ainda trêmulo diante de tal criatura esqueci-me de tantos pensamentos materializados. Tentei demonstrar minhas certezas, mas minha voz me traiu. Arrogante perguntei:
.
- Quem és tu? Quem és tu que atemoriza que desune que é caluniador que confunde e distorce os fatos? Ele desviando o olhar com um sorriso quase angelical respondeu-me:

.
- Sou parte de uma parte que foi todo, uma parte das trevas, que geraram a altiva luz. Mas também sou o que fizeram de mim. Uma representação do mal. Muitos são os injustiçados mas o verdadeiro Pai a tudo vê e tudo compreende. Derrepente como se estivesse no alto de uma torre muito distante disse ainda:

.
- E vc é o medo de tudo viver de tudo amar, mas ainda assim há de perecer diante de sua ignonímia.
Ainda mais estupefato pela loucura que estava vivenciando, perguntei:
.
- De onde vens? Porque começas a desvanecer?

.
- Pois assim é e deves acreditar. Desvanesço pois não sou aqui necessário. Falo agora de dentro de tua cabeça minha criança, enquanto divagas sobre existências divina, esquece-te de tua própria pessoa e estás enlouquecendo devido a teus fracassos em nome da ciência hermética.
.
Neste momento pus minha cabeça em prostação certo agora de ter um propósito pela frente. Peguei minha pena, herança de meu pai, olhei-a contra a luz e algo em meu cérebro se acendeu e escreví como nunca havia escrito. Tal insanidade aplicada aos escritos foi tão extraordinária que não me dei conta de que agora estava livre dos demonios que outrora habitavam meus desejos.

.
Sueli Aduan, Sergio Cajado, Youkai e Léo Metallica
.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Um homem de fé


A fé pode mover montanhas mas não

abre tuneis pra encurtar o caminho. N.M.

Meu nome é Neurolho de Matos. Porque minha mãe fez esta maldade comigo so meu pai sabe. Vivo em pleno século dezoito ou seja, nada mais ha para ser inventado portanto hoje resolvi por fogo no meu laboratório ja que não descobri a pedra filosofal não transformei chumbo em ouro nem inventei o moto continuo.

Hoje ao acordar e ao ver tudo em cinzas não pude deixar de exclamar, macacos me mordam e foi literalmente o que aconteceu. Um tipo de mico muito cabeludo entrou pela janela e me deu uma dentada no

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Às voltas com o tempo




Panta rei, diz Heráclito, se é que disse. Tudo corre, tudo passa, tudo flui. Não posso entrar no mesmo rio duas vezes, porque não será mais o mesmo rio. Muda o rio, mudo eu? Mas, então, a minha nuca que recebeu hoje um beijo e sentiu hoje um arrepio, amanhã -tomara os receba e sinta- não será mais a mesma nuca? Ou não serão os mesmos pêlos a se eriçarem? Ou não a beijará a mesma boca, ainda que seja a mesma? E o caminho que percorro todos os dias até o trabalho, como posso sentir por isso tamanho tédio, se tudo já mudou? Cada árvore, cada passeio e passeante, cada carro e cada nuvem, cada som e cada cheiro e cada cor, cada eu que já passou. Se já não sou a mesma de ontem e não serei eu-hoje amanhã, então, quem sou?

Sim, quem sou? Ontem passei em frente à mesma farmácia na qual um cara fantasiado de pacote de fraldas descartáveis ganhava o seu trocado. Vá lá, honestamente, que era um papel ridículo, era. Mas amanhã ele deixará de ser essa coisa imposta pela necessidade. Eu não, serei eu mesma. Ou não. Talvez cada hora que eu olhe, por cima do parapeito da ponte, o rio que corta minha cidade - rio que já mudou de curso, teve o seu leito assoreado, já inundou a ilha sobre qual se funda nossas vidas- seja uma hora ridiculamente igual. Diferente só meu modo de olhar, minha invenção de viver assim, só olhando, pensando, deixando as coisas acontecerem e eu não mudar. Não mudar? Tudo muda! Eu, me olhando no espelho, meus resquícios de mesmice.

Penso que talvez eu não seja a sombra do tempo consumida pelas cinzas e tons que se desintegram. Nada mais é, o que nem sequer já foi, nem eu. Nas águas, ou em qualquer outro elemento, as marcas que não possuem significado algum determinam as eras, datam a insignificância e a beleza do estado do devir permanente, incluindo eu. Digo então: a compreensão tem de ser conquistada. Digo então: a arrogância tem de ser conquistada. Mas nada nem ninguém conquistará o incontestável estado de movimento indiferente da energia que repousa em todas as coisas. Panta Rei, pensou Heráclito, os olho fitos num rio em que não me banharei. Talvez por força do hábito. Eu periclito, mas rio do mar que outrora pensei.

Heráclito e seu rio. Eu, eu sou mar, eu sou maré. Sou ressaca lambendo as pedras na praia. Sou a chama de uma vela que queima sem cessar, transformando a cera em fogo, o fogo em fumaça e a fumaça em ar. E o dia se torna noite, o verão se torna outono, o novo fica velho. O quente esfria, o úmido seca.

E tudo nos oferece ofertas ocas na vida. Sou todo o nada nadando no vazio no cio do absoluto, perdendo-me no infinito do eco de minhas incertezas azedas. Idas, indas e vindas de uma lima que rola roliça em terreno plano quadrado torto inclinado sem certas ofertas. Sobe, e o que trouxe? Desce o trago da vida que suga convoca convida expira e inspira a (s)er, mais que nada, sendo. O tudo, os vazios dispersos sob os olhos dos cegos. Pulo dos que nada inspiram, desvio dos que nada ofegam, derrapo dos que vegetam, driblo os que esqueceram de morrer. Prossigo doando sobras de espaços vazios a serem preenchidos com palavras lineares desconexas convergentes complexas congruentes óbvias sóbrias. Começo-meio-fim, paro. A palavra sou eu.


A infinitude do passar, passar, passar, e vir a ser um raspão veloz, atordoada de vida, era de muitas eras. Eu era... finita e eterna. Como posso dizer como se fosse lógico este incompreensível fato finito sem fim. A cabeça não alcança a veloz idade do tempo e se desmancha daí, sem ser acaba sendo. A mancha do que passou e não há mais sem deixar de ser. O beijo impresso pela boca que não é, na nuca que jamais será. Eu fragmento me pondo inteira na ficção dos pedaços da vida. O tempo me expandiu em muito mais de muitas vidas. Tornei-me plural de mim tão singular.

E o tempo nos oferece a oportunidade de ser-de-novo, ser-continuamente; o medo de ser-em-partes, ser-fragmentado; a esperança de ser-pela-primeira vez, ser neo-nato. Pérpetuo primeiro de janeiro, ser novo ano a cada momento. Mas o que eu faço com isso que o tempo me faz?


Nada. Porque ele é o Deus/Tempo senhor absoluto. Aceito-o docemente, ouço sua voz sussurrando em meus ouvidos: _Memória e futuro juntos, talvez! Vivo, convivo na alegria de cada instante, na beleza de cada encontro em que me reecontro. Um eu feito de muitos outros e outros e tantos outros. Sou eu às voltas com o tempo.


Estiveram às voltas com o tempo: dana paulinelli, alisson da hora, youkai, christiana, sueli aduan, nanda lym e cristina siqueira.


segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Panta rei



Panta rei, diz Heráclito, se é que disse. Tudo corre, tudo passa, tudo flui. Não posso entrar no mesmo rio duas vezes, porque não será mais o mesmo rio. Muda o rio, mudo eu? Mas, então, os dentes que eu escovarei amanhã - se é que os escovarei- não serão os dentes que escovei hoje? E a minha nuca que recebeu hoje um beijo e sentiu hoje um arrepio, amanhã -tomara os receba e sinta- não será mais a mesma nuca? Ou não serão os mesmos pêlos a se eriçarem? Ou não a beijará a mesma boca, ainda que seja a mesma? E o caminho que percorro todos os dias até o trabalho, como posso sentir por isso tamanho tédio, se tudo já mudou? Cada árvore, cada passeio e passeante, cada carro e cada nuvem, cada som e cada cheiro e cada cor, cada eu que já passou. Se já não sou a mesma de ontem e não serei eu-hoje amanhã, então, quem sou?

domingo, 15 de novembro de 2009

Meu passado, meu futuro.


Tem alguém lá fora, eu sei. Sempre tem, está à espreita, me esperando sair... Ele me quer e eu também o quero, mas e essa dúvida que não me abandona nunca, esse impasse sem fim entre o sonho e a realidade.
Por uns instantes meus pés vacilam, dou um passo a frente, sigo,toco a maçaneta. E num piscar de olhos vejo que todo desejo vem numa explosão lancinante. Tudo é presumido. Olhares e lembranças povoam o vagar lento de minhas ideias. Não não é o desejo que me atordoa, é a dúvida.

Tem alguém em algum lugar que não está a espreita mas tem o mesmo desejo, a mesma duvida mas seus olhos não me vêem, apenas sabem que me tem, de certa forma.
Talvez eu não saiba que ele está lá, só desejo tão fortemente que esteja que chego a acreditar nisso!
Passo a acreditar nele, passo a duvidar de mim. Para preservar minha sanidade busco rastros de realidade. Encontro. Foi real. Vestígios de uma história, cartas amareladas. Mas não quero viver de passado. Já nem quero ser sã. Quero simplesmente tornar tudo isso um presente, dar continuidade.. Fazer com que se transforme em uma vida inteira!
E há uma força, uma intromissão que quer roubar de mim o que construí. Qual o problema que o passado tome para si todo o presente?
É meu! Tanto quanto os sonhos, os desejos, os olhos à espreita, os que não espreitam, mas lá estão.
Sonho ou realidade por uns instantes ou pra vida toda. Não importa, ainda assim, são meus e tão somente.

O outro lado da porta me espera.

Mas para atravessá-la preciso primeiro transpor os umbrais da dúvida e do medo. Entrar nos vãos do desejo. Pular da sacada em um gesto alucinado de entrega.

Quando estar meu próprio olhar no espelho, teus olhos a me seguirem só me darão prazer. Então, só então, te atravessarei.

Talvez não esteja pronta para viver.


Tina, sueli aduan, CajadOmatic, dana paulinelli e Katia Mota.

sábado, 14 de novembro de 2009

Lá fora...

Tem alguém lá fora, eu sei. Sempre tem, está à espreita, me esperando sair... Ele me quer.
.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Segredo sob neve



“Perdera a conta de quantas voltas dera em torno do quarteirão. Em cada uma delas os olhos se dirigiam para a janela do terceiro andar na esperança de que as luzes se apagassem. Ansiava por um sinal de assentimento à sua fuga, de conivência com sua covardia. Mas aquele abajur opalinado que tantas vezes acendera, tateando no escuro, insistia em se manter aceso. O sinal era opaco, mas incontestável: a verdade precisava vir à luz.


Determinado,  parou o carro em frente à entrada do pequeno hotel de apartamentos e depressa se pôs a subir as escadas. Sentia-se cansado. Ofegava. Já não era aquele adolescente atlético e simpático que atraía a atenção das garotas. No segundo andar se deu conta de que apenas o cansaço não era causa suficiente para a taquicardia. Parou para descansar um pouco. As lâmpadas das escadas estavam apagadas e através da penumbra percebeu um corpo caído e que os seus sapatos estavam em uma poça de sangue. Com a visão de um possível cadáver, seus músculos aquecidos se contraíram repentinamente e junto com o susto veio a perda do equilíbrio, os braços dançaram no ar em busca de apoio, mas sua sorte já havia sido lançada. Tombou de costas contra um lance de degraus sólidos e sentiu uma dor aguda e excruciante nas costelas que se partiam com o choque. Mas o pior ainda não passara, com a inércia e a gravidade a seu favor, em sentido sarcástico, rolou escada abaixo em rotação desengonçada, partindo seus ossos do braço esquerdo, seu nariz, seu maxilar, abrindo o supercílio e, por fim, estirando-se de costas contra uma parede de canto qualquer, inconsciente pelas sucessivas pancadas na cabeça.


O barulho estrondoso da queda despertou os vizinhos. Portas se entreabiram. Pessoas assustadas olhavam pelas frestas. Aos poucos deixaram seus apartamentos, vinham de todos os andares e se amontoavam em volta do corpo caído na escada. Estavam prestes a socorrê-lo quando ouviram um grito de pavor ecoando do terceiro andar. Era mais uma vítima, não fora a primeira, nem seria a última daquela noite no Hotel Darbus. Um dos moradores resolveu descer e pedir ajuda na rua quando percebeu que todas as portas estavam trancadas. De repente todas as luzes se apagaram. Apenas a luz do terceiro andar continuava acesa, como um dedo em riste aponta um criminoso.”


Ele, misteriosamente, clareava aquele pequeno espaço na tentativa de que o segredo viesse à tona.  Parou de escrever e releu o texto. Havia escrito muitos romances policiais em sua vida mas deste dependia sua aceitação nesta editora.


Acendeu um cigarro e foi até a janela. Precisava dar continuidade, manter o suspense, despertar o interesse, ser inovador. Jogou-se na poltrona da sala olhando para o teto. Nada mais vinha à sua cabeça. Lembrou-se de antigos filmes com o Humphrey Bogart. Detestava Casablanca. Gostava de A rainha da África.


Resolveu voltar para o hotel. Sentia-se tão quebrado como seu personagem. Olhou o teclado com letrinhas sorridentes e apertou retorno. Nova linha, agora em branco. A luz do terceiro andar se apagara de repente.


Deitado, observando a neve cair por trás da janela, refletia sobre o título do romance abortado. Sobrou neve e faltou segredo. Restava-lhe apenas sono sob neve. Antes dormisse ele que seus leitores.


Tina, Fred Matos, Youkai, Sueli Aduan, Cajadomatic, Dana Paulinelli

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Segredo sob neve

Perdera a conta de quantas voltas dera em torno do quarteirão. Em cada uma delas seus olhos se dirigiam para a janela do terceiro andar na esperança de que as luzes se apagassem. Ansiava por um sinal de assentimento à sua fuga, de conivência com sua covardia. Mas aquele abajur opalinado que tantas vezes acendera, tateando no escuro, insistia em se manter aceso. O sinal era opaco, mas incontestável: a verdade precisava vir à luz.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

CONTA A LENDA...


Conta a lenda que dormia. Uma Princesa encantada A quem só despertariaUm Infante, que viria. De além do muro da estrada. Ele tinha que, tentado, Vencer o mal e o bem... ....Ele dela é ignorado, Ela para ele é ninguém....
...E, se bem que seja obscuro. Tudo pela estrada fora, E falso, ele vem seguro.E vencendo estrada e muro,Chega onde em sono ela mora, E, inda tonto do que houvera, À cabeça, em maresia, Ergue a mão, e encontra hera, E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
Fernando Pessoa

Conta a lenda...

Que do colo branco e nu de Teresa nasciam flores multicoloridas. Alguns se perguntavam se seria magia, outro se seria reação espontânea de uma paixão escondida. A despeito da curiosidade, crescia o mistério. Inútil negar, ainda que de olhos bem fechados o aroma das flores. Dessa lenda, alguns se perguntavam também se isso não poderia ser uma espécie de maldição velada. Porque, por mais que seja inegável o perfume das flores, nada se compara ao colo nu de uma mulher.

Reza também a lenda que Tereza seria a própria flor, que o perfume exalava era dela. De olhos bem fechados escondia de si própria à paixão que dela fazia brotar as flores.

Deixou as flores na mesa. Onde estaria aquele vaso? Vasculhou portas, gavetas e armários como alguém que busca o mapa de secreto de um tesouro perdido, mas decididamente não haveria vasos para tantas flores. Não haveria colo para tantas flores. Não haveria Tereza para tantos amores.

E, de olhos bem fechados, com um quase sorriso, Tereza sonhava,com o dia em que o dono e merecedor de tantas flores chegasse.Ela não era a Teresa de tantos amores, era a Teresa do maior e mais belo amor!

Disparate, conclui apertando o caule do vegetal com tanta força, que estranha a si mesma. Era uma lágrima aquilo que descia na maçã do rosto? Riu. Desdenhou o barulho do grupo de crianças que corria com mochilas nas costa do lado de fora. Não, ela nunca foi uma criança, essas lembranças são tão distantes que parecem uma mentira rara. Mentira confortável como aquelas que inventava a noite, antes de dormir. As viagens que nunca fez e namoros acalorados que nunca teve. É hora de ir, ela sabe: mesmo que a vontade fosse evitar todas aquelas conveniências automáticas que dia lhe guardava a como um plano cartesiano.

Era hora de ser o que sempre foi sonho e pensamento, no entanto, em sua alma o ponto localizado, o chamamento da natureza impondo-lhe sua força, que sentida em todos os poros de seu corpo levava-a, mesmo com um leve sorrir, derramar uma lágrima.
Era preciso romper seus limites. De olhos bem fechados, exalando todo o perfume que lhe pertencia era inevitável viver seu maior desejo. O de ser flor.

Desejo que se apoderou de Teresa e tomou-lhe as pernas e fez delas raízes, e tomou-lhe os braços que se enrijeceram e se tornaram galhos. E de cada pêlo do corpo, uma folha nascia. E de cada saudade vivida, do colo branco e nu, uma flor destinada a murchar. E de cada ponto de seu corpo que já recebera um toque de amor, a pele se multiplicava e cobria um fruto. E seus cabelos se transformaram em ninhos de pássaros. Mas a face de Teresa não se transformara.

Desde então, Teresa é corpo de árvore e face de mulher. Para todo o sempre.

Fim!

Daniela Paulinelli, Leonardo Delarete Pimenta, Katia Mota, Anônimo, Tina, Sueli Aduan.


segunda-feira, 2 de novembro de 2009

A grande solidão


Em momentos como este, retiro meus pensamentos e deixo o mundo divagar sobre o destino. Que se pode fazer? Quando olho, percebo. Percebo e concluo. Concluo e me calo. Ha de haver em algum angulo uma visão não percebida, da ótica a ação basta um momento para criar a solução, mas não me alento e caio no chão sem esperança de encontrar uma saída. A saída é vastidão. Mirar ao longe e só o horizonte. E cada homem é uma ilha.

La neste infinito talvez aconteçam os sonhos mas entregar-se aos sonhos seria egoismo. Proponho um arquipelago de sonhos conjuntos. Embora saiba que minha insignificancia é equivalente ao quanto a nego! Vou iludir-me com esperanças que cabem no vazio da materia, do atomo, no vazio de meu estomago e amago. Neste vazio imenso do mundo. Um mundo superlotado de corações de gelo.. Talvez eu seja um deles!

Mas também sou a percepção sensorial das coisas, sendo elas, as coisas como as percebemos a própria realidade, ainda que instável e caótica, sem nenhuma outra dimensão subjacente ou transcendente, por isso mesmo sigo, me debato, me reviro, me agito, mas talvez nossa labuta seja exatamente esta, permitir que as borbulhas se tornem espuma do mar.Esta vastidão onde me perco, não sei se sou este além do horizonte onde mergulho o olhar buscando vestígios da lua de ontem a noite que escorregou da luz solar. Com a sucessão dos dias enlouqueço do mal da espera...Contei muitas luas e êle não volta.Penso que vou me dissolver, sal em espuma...nevoeiro,bruma.

Então peço perdão por ter ousado imaginar as espumas flutuantes de castro alves, o avesso infinito de meu peso, do que me ata ao chão e me faz olhar para o céu. Alçar vôo, desprender-me da mãe terra que me sustenta com seu ar etéreo, sua agua diáfana que completa os vazios entre minhas moleculas de carbono.

Tenho aqui em meu estomago um nó que não se desfaz, que me lembra que a todo dia essa imensidão do vazio ajuda à reflexão e a encontrarmos a paz de espírito que a vida nos rouba a cada momnento. E como é necessário ter tanto tempo para nada fazer!

O centro escuro das sensações me imprimem ritmo, ilha em oceano de sentimentos. O que se destaca é a auto-piedade, a pena da dor que navega pela vastidao de meu eu.

O vazio me feriu e me aconchegou em seu peito de ebano. As lagrimas do desespero nao cessaram neste conflito, mais aqui terei todo tempo do mundo para me recompor, para achar o centro perdido de mim.

Sou em mim, a imagem do criador, alma imortal, espirito perene em evolução. Neste instante de vida, me pergunto... se vale a pena sentir.

By: Katia Mota, Sergio Cajado, Youkai, Tina, Sueli Aduan Cristina Siqueira, Manuel Afonso
.

.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

E QUER SABER...É PRECISO!



É preciso voltar os olhos para a população feminina como a grande articuladora da paz.
E para começar, queremos pregar o respeito ao corpo da mulher.
Respeito às suas pernas que têm varizes porque carregam latas d’água e trouxas de roupa.
Respeito aos seus seios que perderam a firmeza porque amamentaram seus filhos ao longo dos anos.
Respeito ao seu dorso que engrossou, porque elas carregam o país nas costas.
São as mulheres que irão impor um adeus às armas, quando forem ouvidas e valorizadas e puderem fazer prevalecer à ternura de suas mentes e a doçura de seus corações.
Arnaldo Jabor


Eu não queria ser tão direta não. É que às vezes a gente fica sem escolha mesmo, e aí, não tem jeito, ou você fala ou você fala. Sempre fui de contemporizar, contornar mesmo a situação, essa coisa de ser dada à compreensão, empatia, o diabo, mas cansei dessa cordialidade toda. E quer saber, foi num rompante abri a porta e....

E quer saber? Eu sou egoísta, muito mais egoísta do que você pensa. Eu não faço nada por você, eu faço por mim. Eu venho aqui porque eu sinto vontade, e não porque você me chama. Eu gosto disso, assim, paixão solta e brusca, tesuda. Não me venha com síndrome de fidelidade, de ser só meu (ou só minha, tanto faz), pelo amor de Deus, não me responsabilize pela sua felicidade.
ufa!!!Consegui, mas tinha minhas dúvidas, não é pra menos, a vida toda me segurando, no começo titubiei um pouco, mas depois ganhei força, e a queima roupa saiu isso tudo.
Alma lavada! Os pingos nos "is”, agora sim poderíamos nos entender.

E, quando nossos olhares se cruzaram percebi a expressão de culpa, algo que eu disse teve algum efeito, ele abriu a boca, mais fechou de novo, abriu novamente e, mais uma vez o silencio, na terceira vez sussurrou inaldivelmente "eu não sou feliz". Fechou-a novamente.
É que eu disse tudo sem tropeçar, sem ensaio.
Fugi da inércia submissa e me revirei
em tons sem soluços.Sem pausa,eu?acredito que mudei de signo.
Claro que mudei de signo, nasci de novo.
Criei a força do tempero, acidez necessária para realçar a doçura.
Ele tornou-se espanto, acuado pelo específico, explícito dissabor.
-Quem sabe o que se passou no intervalo ínfimo da intempérie fresca das palavras regurgitadas? Nenhum homem suporta tanta independência. Eles não sabem o que fazer com o tesão, simples e objetivo de uma mulher. Sentiu-se oprimido e incompetente. Esperava uma lágrima, um destempero, mas tudo que teve foi à verdade.
Eu não te amo apenas te desejo.
E quer saber que tal um bom vinho? Esqueçamos tudo o espanto, o egoísmo, as dúvidas, a culpa, a minha, a sua, a do mundo, da nossa pequenez, das nossas misérias, o que queremos e o que não queremos o que podemos e, principalmente o que não podemos dar.
Que tal? Parece bom, começarmos assim do zero.

Vem cá! Vem! quer saber adoro sua companhia, estar perto de você me tira as pressões do mundo.Vamos beber! Sorver o álcool e depois transar, você gosta não é? Feliz ou não, não acho que vai negar, vai? Faça-me feliz, mesmo que seja pelos poucos segundos de meu orgasmo!
Assim bom menino, como todo homem, você é fraco pela carne, e eu como toda mulher temo a solidão, venha me aqueça em teus braços.

NDORETTO, Youkai, Cristinasiqueira, Ira Buscaio, Sueli Aduan.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

E QUER SABER...

Eu não queria ser tão direta não. É que às vezes a gente fica sem escolha mesmo, e aí, não tem jeito, ou você fala ou você fala. Sempre fui de contemporizar, contornar mesmo a situação, essa coisa de ser dada à compreensão, empatia, o diabo, mas cansei dessa cordialidade toda. E quer saber, foi num rompante abri a porta e....

domingo, 18 de outubro de 2009

DAS COISAS DO MUNDO"...saber ou não saber

- Se eu soubesse disso nada teria acontecido.
- Como assim se soubesse? Você não sabia?
- Mas é claro que não. Como poderia?
- Uai! Todo mundo sabe.
- E o que eu tenho a ver com todo mundo, posso saber?
- Saber o quê?
- O que todo mundo sabe, oras!
- Mas você não é todo mundo. Não quer saber, e ainda diz que se
soubesse nada teria acontecido.
- Então nada aconteceu, ou aconteceu? ...

-é lógico que aconteceu, por que não aconteceria?-
ué por que eu não sei!
-e isso muda alguma coisa?
-como que eu vou saber.
-viu é por isso que as coisas acontecem.
-por que, o quê?-por que você nunca sabe de nada.
-entao, eu tenho o poder de não deixar acontecer se eu souber.
-sim, você tem. E você o que sabe?
-eu sei que nada mais sou além da manifestação da sua consciência, agora continue operando o paciente a sua frente e esqueça seus problemas domésticos. -mais preciso dormir.
-agora não, concentre-se!
-eu não sabia juro que não sabia.
-eu sei, ta tudo bem...
Por exemplo, esta artéria aí que vc esta suturando não tem nada a ver com sua dor de barriga, ela é mera conseqüência dos seus excessos a mesa, e fora dela, wow, pinça, quase escapou!
– Mas o que todo mundo sabe? Ce falou que todo mundo sabe... o que todo mundo sabe?
– Cada um o que deveria saber.
– Bom! Isso me isenta de qualquer culpa!
– Tem mesmo que ser tudo uma questão de culpa? Culpa, pecado, castigo, mas que sisteminha mais falido , hein? Coisa do capeta!
– Olha o batimento, ta subindo. – Sob controle. Pressão normal.
– O que é que cada um deveria saber?
_ não me olhe assim.
-eu não sei de mim, cara! E vc vem com essa! Eu tenho uma tia e sei, vc ia gostar dela.

Ontem, antes da gente sair da boate, ela me ligou e, contou uma coisa, não te contei, não?-o que ela te contou?-ela me disse que sabia o que você fez!-ela sabia . Como? Pensei que só a gente sabia disso.
_o que eu faço agora?-agora? Você retira o tumor da parte superior do fígado e cuidado para não cortar a artéria!
_Entao, você sabe ela também é medica e essa é a coisa ninguém deveria saber, a outra que todo mundo sabe e que não é sua culpa, essa que você não sabia até poucas horas atrás, é culpa do seu pai por isso relaxa!-meu pai! Mas essa sua tia! Não entendi por que eu iria gostar dela?
-pelo simples fato de que ela descobriu e não vai se intrometer. Ela prometeu. -verdade?Fico aliviado,
-é o melhor mesmo, pois depois da operação temos que encobrir o que você fez para ninguém mais descobrir.Ou você quer arriscar perder sua licença?
-nao, minha licença nao...

- Mas...., vem cá... Pra quem não sabia de nada, você está sabendo bastante não?
- Ehhh, hum... eu? Não sei de nada não, só comentei o que minha tia falou... Aliás, alguém contou a ela e sabendo que te conheço...- Hã... e ela "sabe" quem contou? E... o que você sabe?
_não sei nada!!! E ela pensa que sabe, mas não sabe. Sabe essas coisas que a pessoa bota na cabeça, acredita e pronto. Não há Cristo que tire.E por falar em Cristo, se eu fosse vc, rezava.-se eu quisesse conselho teria pedido,mas não quero, nem sei o quero...
aff...se eu soubesse, nem passava por aqui...mó babel, cara! Olha lá neguinho com a barriga aberta....ichiii! O médico tá doidão...jésus!! E quem é aquela montada no modelito, fumando com piteiraaa!? Aquilo na mesa...é um cadáver,? É um cadáver....?-relaxa, mano,hum, tu quis entrá achando que era festa de bacana, que a gente ia sair com dólares e Dolores, blábláblá...véi, tem sangue pra todo lado...deve ser algum ritual macabro ou um bandode maluco...ad Tempus fugit não é uma boate, Lacraia...é...é...AAARRGHH!!!!
Lacraia, Lacraia, são os "coisa ruim", é zumbi, tudo zumbi, conheço pelo olho, alma penada querendo encarná...Socorroooo!!!
_Não grite. Acalme-se! Vamos: respire fundo, isso assim. Não fale agora.
-Eu vi! Vi sim, aquele cadáver, a moça com a piteira, sangue pra todo lado.
-HAHAHAHAHA, só rindo mesmo! Você é igualzinho minha tia, incrível, ela pensa que sabe e, vc que viu.
-Não, não penso. Vi sim!!

-Olhe, olhe bem ao redor, não há nada aqui, todos já foram só os do plantão da noite chegando, além daquele cãozinho ao longe, e vc nesse eterno dilema:
_saber ou não saber.!
_Sabe de uma coisa. Eu sei, você precisa...

Entender. Precisa entender... Você não sabe...
- O que está fazendo com essa faca?
- Fique longe... Fique longe... afaste-se de mim... Nãããããoooooooo....
Banhado em suor, respiração ofegante, sentou-se na cama, olhou no relógio... Já estava atrasado.

Youkai, Cajadomatic, Kátia Mota, Neuza Pinheiro, Sueli Aduan,

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Das coisas do mundo


- Se eu soubesse disso nada teria acontecido.
- Como assim se soubesse? Você não sabia?
- Mas é claro que não. Como poderia?
- Uai! Todo mundo sabe.
- E o que eu tenho a ver com todo mundo, posso saber?
- Saber o quê?
- O que todo mundo sabe, oras!
- Mas você não é todo mundo. Não quer saber, e ainda diz que se soubesse nada teria
acontecido.
- Então nada aconteceu, ou aconteceu? ...

Renitencia estrutural


Nas noites de frio é melhor nem nascer
Nas de calor, se escolhe: é matar ou morrer
E assim nos tornamos brasileiros
Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro
Transformam o país inteiro num puteiro
Pois assim se ganha mais dinheiro
Cazuza/Arnaldo Brandão
.
Passando na frente de uma loja ouvi o radio que tocava uma musica antiga. O refrão dizia, a tua piscina ta cheia de ratos... e foi sumindo na distancia. Andei um pouco mais e engatei a mesma metrica na mesma melodia, a tua caveira ta cheia de ossos... Atravessei a rua e a coisa martelava, a tua banheira esta cheia de patos...a tua cadeira esta cheia de pregos... e foi piorando. A tua bexiga esta cheia de choppis... E não parou por aí.
.
A tua mesa está cheia de restos...a tua vida está cheia de cacos...e martelando numa mesma batida frenética continuava: suas ideáis não correpondem aos fatos... Parei. Como as idéias não correspondem aos fatos? São fatos!!
.
Dei meia volta e comecei a voltar pelo mesmo caminho, tentando tornar a musica audível novamente. E o tempo não pára. Não pára, não, não pára. Quando se vê já são seis horas, quando se vê,já é sexta-feira, quando se vê, já é natal, quando... agora é tarde... tarde pra se viver o que ja passou o que ja perdi pois o tempo o tempo nao para e quantas palavras audiveis deixei de cantar de rimar...
.
O refrão vindo da loja. O que criei a partir daí...os fatos quando fatos, o tempo que não pára, o que passou, o que perdi, as palavras que deixei de rimar estavam impregnados na minha mente e eu matutando seguia calmamente, quando derrepente a ficha caiu e foi então que percebi, que não era eu a quem a musica havia impregnado, estava entrando na ideia de outrem sem que me desse conta disso. Minhas ideias não estavam correspondendo aos fatos.

Quando enfim
cheguei de volta a frente da loja, o tempo parou.
.
Houve um silencio. Ninguem pensando? Timidamente o som veio vindo de novo, baixinho, mal se ouvia. Agucei meus sentidos... mais um pouco... até que pude ouvir uma frase completa:
.
- Eu quero a sorte de um amor tranquilo, com sabor de fruta mordida.
.
Olhei em volta, quem seria? E ali pra meu completo espanto uma outra realidade, um mundo paralelo. Nem tanto, pensei, nem tanto. Pensamos. E era apenas o pensamento coletivo em forma de musica. Ao longe, a minha volta, todos. E uma fruta mordida.
.
Imaginei que sabor teria a fruta mordida. Quem teria mordido e se por algum acaso, destes que ocorrem sem o menor sentido, o tempo teria de fato parado dentro de minha cabeça. Foi quando descobri que não existem acasos e que a mecanica de nossas vidas são mais regidas por nossos atos do que pela posição dos astros no espaço sideral.
.
E estava assim filosofando quando ouvi la longe alguem cantando o jingle das lojas Marabrás...
.
Sueli, Katia, Maferar & Sergio

domingo, 11 de outubro de 2009

Renitencia


Passando na frente de uma loja ouvi o radio que tocava uma musica antiga. O refrão dizia, a tua piscina ta cheia de ratos... e foi sumindo na distancia. Andei um pouco mais e engatei a mesma metrica na mesma melodia, a tua caveira ta cheia de ossos... Atravessei a rua e a coisa martelava, a tua banheira esta cheia de patos...a tua cadeira esta cheia de pregos... e foi piorando. A tua bexiga esta cheia de choppis... E não parou por aí.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

"Da garrafa de Coca-cola a uma calma incendiária"

Tinha ainda alguns minutos até ter de sair definitivamente para o trabalho. Respirou fundo, sentada à cabeceira da mesa, sozinha, o prato meio vazio, o copo meio vazio e a sua frente do outro lado da mesa a Garrafa de Coca-Cola.
"Que ironia!" - todos em casa e o que lhe fazia companhia à mesa era uma Garrafa de Coca-Cola e os restos de um almoço.

É a vida... Cada qual com os seus próprios problemas. Sentindo-se culpada por não ter terminado sua refeição, empenhou-se, nos minutos seguintes, a comer e beber tudo o que estava a sua frente.
O pastor da igreja sempre diz:
_Há tanta gente no mundo morrendo de fome, desperdiçar alimento é uma tremenda falta de respeito. Então comeu em silencio, e também tinha um segundo motivo para se alimentar bem, este era mais pessoal, estava grávida de cinco meses. Um belo menino seria projetado ao mundo de dentro de si.
Foi esse pensamento que a animou e desfez sua solidão.


Cinco meses e nenhuma palavra. Privou-se do alimento por todo aquele tempo, mas o que lhe havia servido isso? Para que ele não percebesse? Mas já estava ali. E uma hora notaria. Sentiu uma tremenda vontade de se deitar e dormir depois de ter comido tanto. Podia ligar no trabalho e dizer que não se sentia bem, por isso, não voltaria mais ao escritório naquele dia.

Afinal já tinha resolvido às questões mais urgentes. Queria ficar em casa. Seu desejo era adormecer pelo resto do tempo que faltava, antes de parir e começar uma nova vida. Seu belo corpo havia se transformado. Perdera a cintura, a barriga, já não lhe cabia dentro das calças.
Fernando não a desejava como antes, sequer a tocava, e nos últimos dias, pouco ouvira o som de sua voz.

Ontem, ao abrir o armário do escritório, seus olhos caíram no vazio, ao encontrar uma carta, era de sua irmã, há anos não falava com ela devido a uma briga que tiveram quando ainda eram adolescentes. Mas, para seu espanto maior, a carta não era para ela, mas, para Fernando.
Uma grande dúvida tomou conta de seu ser: Deveria ou não abrir a carta?
Não deveria! E não abriu, guardou-a de volta. O que quer que estivesse escrito não era endereçada à ela, e também não queria saber das palavras de sua amarga irmã. Deixou estar, mais hoje ao menos havia algo para chamar de companhia, não.

Num gesto rápido, de desespero, abriu o armário, pegou a carta novamente. Coração acelerado, mãos trêmulas, olhou o envelope, a letra delicada, o cheiro agridoce e, tudo lhe veio à memória: a irmã, Fernando, os restos de vários almoços, a casa... e suas únicas companhias: uma carta e uma garrafa de Coca-cola. Automaticamente trancou a porta e abriu a janela.

E novamente a dúvida: Abri-la? Essa era a decisão mais acertada. A gravidez ainda não podia ser notada e ainda não tinha idéia do que fazer. Não podia correr esse risco agora. A caligrafia corrida, indicava pressa ao escrever. A principio amenidades, porém, sabia que algo deveria estar escondido naquelas entrelinhas. Até que surgiu a palavra, o Nome proibido:
Traição... Traição... Tra-i-ção

Podia sentir o coração batendo nas temporas. Respirou fundo e tomou coragem de ler até o final. Aos poucos foi tomada de uma calma incendiária. Não pode impedir o sorriso estampado no rosto. A satisfação.
Entumeceu a barriga, acariciou-a lentamente.


Youkai, Katia Mota, Jacke, Ira Buscacio, Tina, Mariana, Sueli aduan.





quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Uma garrafa de Coca-cola

Tinha ainda alguns minutos até ter de sair definitivamente para o trabalho.
Respirou fundo, sentada à cabeceira da mesa, sozinha, o prato meio vazio, o copo meio vazio e a sua frente do outro lado da mesa a Garrafa de Coca-Cola.

"Que ironia!" - todos em casa e o que lhe fazia companhia à mesa era uma Garrafa de Coca-Cola e os restos de um almoço.

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Gerundio Passalaqua e as sutilezas da Paixão

Foi na Barra funda em meados de 1733 que Gerundio Passalaqua experimentou a primeira vez. Não se pode dizer que ele sentiu volúpia, mas um destes estados neutros que beiram o êxtase e o desespero. Foi por assim dizer um momento pródigo cheio de tensão e surpresa destes que ficam durante anos impregnando os canyons de nossa memória com a sutileza de um furacão.

E, que faço agora? Vivo somente dessa recordação, com os olhos sempre voltados para o chão, perdido feito um cão.
Hum! Só me faltava querer se poeta, e pelo andar da carruagem, não tenho o menor talento.

Quem sabe eu possa escrever alguma coisa, mas não em verso. Esse aperto não quer passar todos os dias atrás desse balcão vendendo, e pensando na mesma coisa.
Um dia atrás do outro, entre o zelo e desmantelo, sigo arrastando, como correntes, aquele desespero travestido de euforia.
Na corda bamba com o coração em compassos de samba.

E entre balcões, bêbados e suspiros, mais um dia se foi, tenho de arrancar de vez essa imagem, como as peras que apodrecem sob o prato, sinto-me definhar. O relógio não detem a morte das peras, não posso deter em mim esse pulsar,

Saio do balcão, lá fora o sol me aquece, e descubro que não adianta nada, o calor não afasta o frio da alma. É muita sorte estar tão quente neste inverno que a pouco era rigoroso. Fixo meu olhar nas carroças, distrações a parte, a memória pulsa.
Por que meu pai? Deus todo poderoso. Por que me atormenta e castiga?

Vou pedir o resto do dia de folga, embora esteja tão cedo meu patrão há de entender. Há sim. É que quando a gente chora o relógio parado, a morte do tempo, nem sabemos que dia é o hoje. Perdi mesmo a noção do tempo, também só faço chorar, nessa solidão sem fim, mas eu não me chamo Gerundio Passalaqua se hoje não me perder de tanto amar.

Amar, minha mulata de bronze, que saudades tenho de ti... Não a vejo há apenas dois dias, mais me sinto como se fossem décadas, meu coração verte lagrimas de desespero sabendo que nosso amor secreto não pode ser legitimado. Devo casar-me com Karmem, mais é a ti que amo.

Meu senhor! Viro-me para meu patrão, que recostado na parede da entrada do mercado pensativo. Diz:
_não fique ai a pensar, faça como eu, a cada passo que dou sinto meu coração bater, sinto a vida em todo seu esplendor, rodeado por cor e luz.
Todos os poros da minha sensação de pele macia apreciam esta brisa que me rodeia, me faz sonhar, me ajuda a continuar lutando, continuar a amar, confiar, e esquecer os dias negros.
Por um momento eu sinto a força da vida que cresce dentro de mim e com essa força eu sinto que posso continuar a seguir!
Bebendo desta fonte Inesgotável.

A fonte de onde tudo nasce, o desejo, que fica impresso no fundo das nossas vidas para sempre, que ficou em mim, Gerundio Passalaqua, em Karmem, em Marias, Antonios, Pedros, Vinicius, nas multidões, na Barra Funda, em Montmartre, em Cádiz, mundo afora.
O desejo de tudo comer.

CajadOmatic, Youkai, Kátia Mota, Grupo CeroVersoB , Meu Cantinho ,Sueli Aduan

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Foi-se o martelo (tit &¨imagem prov. 78.453)


Foi na Barra funda em meados de 1733 que Gerundio Passalaqua experimentou a primeira vez. Não se pode dizer que ele sentiu volúpia mas um destes estados neutros que beiram o extase e o desespero. Foi por assim dizer um momento prodigo cheio de tensão e surpresa destes que ficam durante anos impregnando os canyons de nossa memória com a sutileza de um furacão.

No telhado tinha um homem...tinha um homem no telhado...no telhado...


..e que Nietzsche estava certo e que Deus está morto.
Blasfemo contra todos os santos e digo que o
fim está próximo
.


Digamos que eu suba no alto de um prédio e comece a gritar como um louco às 4 horas da manhã. Xingo o prefeito canto musicas de mau gosto e atiro longe meu sapato que cai num teto de zinco com o maior estardalhaço. Suponhamos que eu faça tudo isso sem o menor pudor, respeito ou vergonha na cara. Fico ainda pelado e começo a correr por cima das telhas. Jogo uma garrafa de wodka no meio da rua, acendo um baseado e danço todo desengonçado. Mijo lá de cima na capota dos carros parados e digo que Nietzsche estava certo e que Deus está morto. Blasfemo contra todos os santos e digo que o fim está próximo. Aí do nada surge uma figura e me diz:

Maninho você viu meu fígado, não estou encontrando meu fígado...
-que fígado Pedro! chapou de novo é...
-é culpa sua, não vê minhas vísceras espalhadas sobre meus pés...
olhando mais atentamente Clark percebe a ausência de órgãos no abdômen de seu irmão, ao chão misturado sobre sangue negro e fétido encontram-se intestinos, rins e uma gosma gordurenta e amarelada de cor de pus que recobre a carne destroçada...
-meu deus homem o que aconteceu com você? Despejou tanto desespero em sua voz que se assustou e olhou para os lados freneticamente...
-o que, não se lembra mais? Maninho você me deixou morrer. o pó, lembre-se, o pó maninho.
-seu velho punk desgraçado suma daqui, seu merda maldito, maldito, me culpa por tudo, sempre culpou, não foi minha culpa, não foi minha culpa, não foi... os gritos irromperam de sua garganta cortando o céu rubro da noite, mais foram cessados pelo vomito que escorreu entre seus dentes e banhou seu tronco nu, tombou para frente de joelhos, suas órbitas viraram e desfaleceu sobre a possa formada pelo seu próprio vomito...

A manhã rompia quando recobrou os sentidos, ou acordou, ou a ressaca, o cheio, o calor começou a incomodar. Não havia ninguém ali, nenhum sangue, nem víceras, nem nada, só. Estava completamente sozinho salvo pelo sol que começava a tingir o céu de magenta.
Que sonho! Que alucinação!
Desceu do telhado, envergonhado, descalço, sujo.

Dignidade era algo que Pedro não podia esperar para si naquele momento, mas não precisava de dignidade, sim, de um bom café, com torradas e geléia.
O dia havia restaurado toda sua consciência e Pedro não tinha alternativa, a não ser encarar sua fragilidade. Levantou-se e foi ao encontro daquela mulher, não sem antes passar em casa, dar um tapa... conseguir se por apresentável.

A decisão estava tomada, não iria fraquejar dessa vez. É isso mesmo.
Dessa vez eu pego aquela zinha, não vou dar tempo não, quando ela perceber já era cara, o 38 vai estar dentro da sua boca, vai pagar caro cada telha quebrada, cada garrafa de vodka que enfiei goela abaixo, não ficará impune.
Quero olhar fundo em seus olhos e, me permitir sentir toda a repulsa, toda raiva... daqueles olhos verdes, daqueles...olhos Verdes como o mar, verdes como os pinheirais...verdes.. verdes..Chega maldito, pensamento. Cadê meu revólver daqui...

E, assim após uma breve caminhada escada abaixo, pelado mais determinado irrompeu pela porta do apartamento 543, apartamento que não lhe pertencia, mais seu proprietário não se importaria que fosse reocupado, afinal estava meio morto, era o apartamento de seu irmão.
A primeira coisa que fez não foi tomar um banho, mais sim dar um tapa, a coca em cima da mesa também não lhe pertencia, mais quem reclamaria, no fundo a merda toda já estava feita, aqueles traficantes italianos não largariam do seu pé até que a divida estivesse paga com seu sangue, divida esta que também não lhe pertencia, mais o diabo já havia enfiado o tridente em seu rabo.
Rapidamente limpou-se, chapou o cabelo louro para traz com gel, vestiu um paletó cinza e de dentro do criado mudo retirou o revolver calibre 38 , este sim lhe pertencia.,pegou também as chaves do velho mustang do tio Vincent, que emprestará no dia anterior, e saiu pela porta a caminho da fábrica, onde encontraria aquela vaca que traiu seu irmão...
mais antes mais um tapa...um tapa...e o improvável aconteceu...uma lucidez surgiu dentro de si, já não era o mesmo e, com toda certeza não era efeito daquela droga.
Sentiu-se renascer a caminho da fábrica, talvez a paisagem... ou o som do velho mustang. Tio Vicent sabia das coisas d'alma.
Vivaldi e uma imensa alegria.

Então, desligou o motor, seu rancor já não extremava mais atitudes que poderiam lhe causar danos profundos na alma, muito além, de todo o pó da civilização. Ansiava por liberdade. Sabia que era inevitável o sentimento de perdão. Não suportava mais sua escravidão e diante daquela mulher, que tanto odiara, daquela vaca infame, seu olhar apiedou-se. Ali estava a grande chance, de reconciliar-se com sua amada, mas foi
nesse exato momento que ouviu :
-Eu sou aquela a quem tu clamaste todo esse tempo, e digo-lhe que fizeste tua lição corretamente, vejamos; perdeste toda confiança em ti, conseqüentemente não mais enxergas o outro. Renegaste todo e qualquer "invisível" transformando-se em uma figura deplorável. Profanaste o templo que está em tí e finalmente entregaste-me o que há de mais valioso no Ser, a tua Alma!!!!!
Quando a velha sem nome começou a aplaudir, a aplaudir pausadamente o espetáculo solitário que eu fazia. Aplaudia com a força do flagrante Segurei meu pau.
Um calor do inferno vinha do corpo. Uma alegria escancarada de ser imoral!

E, ali sozinho nu o calor foi cedendo, cedendo....lentamente, e agora já sentado, com uma vista privilegiada, olhei ao meu redor, escutei o silêncio da noite, olhei lá longe os pinheirais verdes, relembrei os olhos da minha amada, na mente as palavras de Nietzsche misturavam-se com a de um outro,o rabino Bonder, Nilton Bonder, e seu livro, A Alma Imoral, leitura em que percebi, que podia repensar minha vida, escolher um novo caminho.
Mesmo porque, com Deus morto, e com a minha vontade de potência, descubro que não sou imoral, apenas humano demasiado humano.
Sérgio cajado, Youkai, Katia Mota, Ira Buscacio, Sueli Aduan, Célso Ramos, NDoretto.